Entrou de rompante na casa-de-banho onde quase atropelou o companheiro de casa.
- sai! estou super atrasada...
- tem calma que eu ainda não estou pronto.
- Mas tu já tomaste banho! sai!
De um empurrão, tira André, com a escova de dentes ainda na mão, da casa-de-banho.
Fecha a porta e prepara-se para o banho.
Do outro lado da porta:
-Até logo.
Deste lado, nada. Típico dela, não falar mais que o estritamente necessário quando ainda está ensonada...
A água quente estava a deixá-la num estado ainda maior de sonolência, não estivesse de pé tinha dormido ali, assim, quase que caíu na banheira. Abriu os olhos e exclamou:
- Opá, que estúpida. Acoooorda!
É sempre a mesma merda, dorme a dormir, dorme acordada, dorme até em pé. Passa a vida fechada num mundo imaginário. Por vezes questiono-me se ela é normal.
Gostaria que ela fosse homem, porque dizem que não se bate em mulheres. Se fosse homem eu desmontava-a à pancada até ela acordar. Ela se fosse ele, pois nos homens parece que é aceitável bater.
Acooorda badalhoca, acorda desse sono que mais parece um coma. Abre os olhos e olha à tua volta, com olhos de ver, sai desse teu mundo de ilusão, cheio de Humpty Dumpty's, cavaleiros andantes, princesas, príncipes encantados e fadas madrinhas.
O mundo é de, fritos da tola, xungas em carros xuning, falsas pudicas, príncipes disfarçados e fodas à bruta.
E isto fazia sentido. Ultimamente, só saía com os amigos mais próximos, porque sabia que não ia ter que aturar nenhum penetra no grupo, que mais tarde se demonstrasse autêntico frito. Esta opção, ao mesmo tempo que criada por si, aniquilava qualquer contacto que pudesse vir a ter fortuitamente com um desconhecido. Andava de transportes públicos, e das poucas vezes que saía a pé, levava com os faróis azul-cueca-flash, e todo o aparelhómetro de alguns automóveis espécie lego-kinder. Só tinha conversas de merda com o pessoal do costume. [a aprendizagem, descoberta e vivências, passavam para um outro plano. O plano do esquecimento] . Pisava a cada passo que dava, Leonardos DiCaprio. E as fodas... bem, as fodas eram quecas rápidas com direito a açoites na nádega direita.
Aí ela vazava tudo o que queria fora dela, quer seja ao escrever os seus sonhos, pensamentos e ideias em páginas perdidas no mundo dos blogues, Hi5's, NetLog's e outras. Expulsava o que queria, dizia o que pensava. Falava com estranhos em MSN's, Skype's, etc. Sentia-se de facto mais leve, mais livre, mais ela, mas não era ela, era sim o sono profundo pelo qual ela geria a sua vida. O que escrevia não era na verdade uma libertação mas sim o oposto, pois as palavras estavam presas ao seu sono profundo que era a sua vida. Em chat's ela não era ela, era sim quem queria ser. A cada palavra, a cada frase desta sua falsa libertação, ela estava cada vez mais presa ao seu mundo de ilusões.
FIM.