chamas
e outras chamas como línguas vermelhas e aguçadas, quentes e abrasadas. É sempre assim. Quando me sinto no limbo, (entre o que devo ou não fazer) penso sempre no inferno e não sei explicar porquê. Continuo?
Ainda estou a pensar se continue em frente, ou se vire para a direita. Melhor mesmo, só para outro país... Acabei de me queimar com o cigarro. (Não, não tenho dessas taras) Um palmo mais à frente e estaria a colocá-lo no cinzeiro, assim, como tive que travar de repente por estar a olhar para baixo, deixei cair a puta da beata... Virei realmente para a direita porque fraquejei.
São os nervos agora. Consigo senti-los à flor da pele.
Estou a chegar e já só me apetece desistir da ideia e voltar para trás... Ai... Hoje teria sido um bom dia para não ter saído de casa. Teria inventado uma gripe, um tornozelo deslocado... Pfff!
Hoje, se não tivesse já combinado e recombinado coisas, teria sido um bom dia para ter ficado na cama.
Visitar parentes e conhecidos que já não vemos há muito tempo é sempre desconfortável. Bem, pelo menos para mim. Mas pior que isso, só mesmo funerais e
casamentos
que vejo agora como ilusões. O meu corpo cede, lentamente sinto-me a desistir. Ouço uma voz que me chama, é o meu pai que irrompe pelas chamas pegando em mim, soltando-me. Volto-me para o abraçar mas ele já lá não está. Vejo-o ao longe tentando libertar a Ana das chamas e elas tomam-no em segundos, no momento em que o chão cede e os vejo desaparecer à minha frente.
O meu pai, a minha mãe, a Ana. Todo o meu mundo destruído enquanto eu ainda estou nele.
No meio de um calor que não sinto, gelo no local onde estou. O meu mundo ruiu e sem ele não tenho onde
viver.
E era mesmo isso que eu ia fazer. Mas antes, só queria descansar...
Já longe do desconforto, chego a casa e dirijo-me para a sala. Um copo de vinho para acalmar é sempre reconfortante. Pego numa garrafa ao acaso e abro-a.
Sentei-me no sofá com os olhos postos no ecrã da televisão desligado, e fico a olhar para o meu reflexo.
O vinho não é nada de especial. É alentejano e tinto, (embora na garrafa esteja escrito que a cor é de um "rubi intenso"), e alguém mo ofereceu recentemente. Acho eu...
E já estou a ficar com sono. Grande vinho!