Chamas  

Posted by Bruno Fehr in

Acordo com fumo a invadir-me as narinas. Os meus olhos piscam, não os consigo manter abertos. É quase impossível respirar... A temperatura é insuportável. Os pelos dos meus braços desfazem-se. Uma onda de fogo vinda de baixo atinge-me, dispo as roupas que tenho em chamas. Choro em agonia soltando um grito silencioso, sinto a cara como que a derreter. Cambaleio em desespero, buscando oxigénio mas numa direcção não definida. „Mãe, pai, Ana“... Tenho de chegar a eles. Como que por instinto encontro a saída do quarto, a minha perna fica presa quando o chão de madeira cede parcialmente. Vejo a Ana envolta numa bola de chamas numa estridente agonia que me fura o coração. As minhas lágrimas secam assim que se formam. Olho o corredor e vejo um corpo negro no chão. Não sinto forças para lutar, sinto-me sim preso a este chão por uma força que não entendo. Todo o meu mundo, toda a minha vida, está em
chamas
e outras chamas como línguas vermelhas e aguçadas, quentes e abrasadas. É sempre assim. Quando me sinto no limbo, (entre o que devo ou não fazer) penso sempre no inferno e não sei explicar porquê. Continuo?
Ainda estou a pensar se continue em frente, ou se vire para a direita. Melhor mesmo, só para outro país... Acabei de me queimar com o cigarro. (Não, não tenho dessas taras) Um palmo mais à frente e estaria a colocá-lo no cinzeiro, assim, como tive que travar de repente por estar a olhar para baixo, deixei cair a puta da beata... Virei realmente para a direita porque fraquejei.
São os nervos agora. Consigo senti-los à flor da pele.
Estou a chegar e já só me apetece desistir da ideia e voltar para trás... Ai... Hoje teria sido um bom dia para não ter saído de casa. Teria inventado uma gripe, um tornozelo deslocado... Pfff!
Hoje, se não tivesse já combinado e recombinado coisas, teria sido um bom dia para ter ficado na cama.
Visitar parentes e conhecidos que já não vemos há muito tempo é sempre desconfortável. Bem, pelo menos para mim. Mas pior que isso, só mesmo funerais e
casamentos
que vejo agora como ilusões. O meu corpo cede, lentamente sinto-me a desistir. Ouço uma voz que me chama, é o meu pai que irrompe pelas chamas pegando em mim, soltando-me. Volto-me para o abraçar mas ele já lá não está. Vejo-o ao longe tentando libertar a Ana das chamas e elas tomam-no em segundos, no momento em que o chão cede e os vejo desaparecer à minha frente.
O meu pai, a minha mãe, a Ana. Todo o meu mundo destruído enquanto eu ainda estou nele.
No meio de um calor que não sinto, gelo no local onde estou. O meu mundo ruiu e sem ele não tenho onde

viver.
E era mesmo isso que eu ia fazer. Mas antes, só queria descansar...
Já longe do desconforto, chego a casa e dirijo-me para a sala. Um copo de vinho para acalmar é sempre reconfortante. Pego numa garrafa ao acaso e abro-a.
Sentei-me no sofá com os olhos postos no ecrã da televisão desligado, e fico a olhar para o meu reflexo.
O vinho não é nada de especial. É alentejano e tinto, (embora na garrafa esteja escrito que a cor é de um "rubi intenso"), e alguém mo ofereceu recentemente. Acho eu...
E já estou a ficar com sono. Grande vinho!

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6 Devaneios

A isto chamo missão cumprida, o primeiro cadáver realmente esquisito.

Noto, pois sei que foi propositado que fugi à palavra casamentos... é que estava mesmo noutra onda, ahahahaha

22 de maio de 2009 às 04:04

Uiiiiii...

Este cadáver ficou MESMO esquisito... lol

Acho que nem os do CSI resolviam este...

Beijitos :)

22 de maio de 2009 às 12:22

Olhem , eu gostei , fiquei com aquela sensação que acabou cedo demais, por isso curti.

Hehehe

22 de maio de 2009 às 14:45

é esquisito termos conseguido desta vez. :D

22 de maio de 2009 às 17:44

Duas histórias diferentes contadas cada uma no seu tom.

AS chamas continuam as chamas, e alguém depois de visitar alguém, volta a casa para um repouso merecido.

Quem sabe ligue a tv e ouça falar da familia que foi impiedosamente consumida pelas chamas.

Não um cadáver, mas dois, que estavam afastados por aquela esquina que nos afasta sempre da realidade do vizinho e nos encarcera na nossa.

22 de maio de 2009 às 17:46

Este post sabe a sonho esquizofrénico. É que parece mesmo a mesma pessoa a viver duas realidades ao mesmo tempo.
E estou como a I.D.Pena. Acabou cedo demais!

24 de maio de 2009 às 13:26

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