Mercador de almas  

Posted by LBJ in


“I sold my soul to the devil”. As palavras ecoam-me na cabeça até saírem pela boca, como um verso repetido de uma canção de que só me lembrava esta linha. “I sold my soul to the devil”. Se não se pode iludir a morte, poderia eu tentar iludir o diabo? Esconder a minha alma para que não a pudesse cobrar, simular aos olhos do demo a minha continuidade em vida mesmo depois de morto.

Troquei a alma por um punhado de sucesso, nem sequer estava desesperado faminto ou sedento nem desalentado somente quis atalhar caminho e não perder mais tempo. Não fiquei imensamente rico nem dormi com quem quis dormir, foi apenas um punhado de sucesso e agora não queria pagar o preço. Clamei por deus que me acudisse.

Imaginei que o melhor meio de falar com deus era de joelhos com os dedos das mãos entrelaçados e num tom de súplica. Queria propor a deus que roubasse uma alma ao diabo e que me deixasse continuar vivo mesmo depois de morto. Sabia da disputa de deus e do diabo na contabilidade das almas dos homens e por isso parecia-me um acordo justo, vendi a alma ao diabo mas só a poderia cobrar depois de morrer, assim pedi a deus que aceitasse agora uma hipoteca pela minha alma na troca da ilusão da vida e que juntos ludibriássemos o diabo. Tinha a certeza que deus teria sentido de humor e que tiraria algum prazer em enganar o rival. Estive de joelhos em súplica mas deus não me ouviu.

Falhado o contrato com deus, restava-me a possibilidade de tentar esconder a minha alma longe dos olhos do diabo. Alguém me disse que o mundo dos sonhos é feito de almas perdidas e tentei deixá-la por lá num sonho esquecido. Andei assim neste mundo meses vagueando sem alma mas os sons não me soavam, nem os cheiros me cheiravam, nem os sabores me sabiam, nem as imagens me imaginavam, nem os toques me sentiam e de repente o punhado de sucesso se pouco sentido fazia, passou a fazer nenhum e voltei a mergulhar nas águas dos sonhos e procurei pela minha alma dias a fio até a encontrar quase tão murcha como a sombra de algo que já morreu. Trouxe-a de volta.

Quis devolver ao diabo o punhado de sucesso mas o diabo não aceita reembolsos. Quis fazer ver ao diabo que a minha alma era coisa de pouca valia mas o diabo riu-se e disse-me que pouco era mais que nada. Quis implorar ao diabo mas o diabo não é piedoso mas somente um fornecedor de penitências. Por fim olhou para mim e perguntou-me se queria renegociar a minha alma e eu disse que sim e tornei-me a seu serviço um angariador de almas, troquei a minha por outras, estranhamente não deixei de ter medo da morte.

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7 Devaneios

«May you be in heaven a full half hour before the devil knows you're dead» é um conselho sempre precioso.

19 de fevereiro de 2010 às 00:32

AHAHAH, grande filme :)

Beijos

19 de fevereiro de 2010 às 23:54

Eu sei que filme andaram vocês a ver.

Se é esse mesmo...

Que treta...

O texto...

Gostei mas lá está, ler um texto bom que me lembra um filme mau...

Pronto...

:s

23 de fevereiro de 2010 às 21:01

Jane,
erraste no filme. Não é esse; é outro.

24 de fevereiro de 2010 às 17:09

Dizem que o Diabo sabe muito, não por ser esperto, mas por ser velho...

Mas creio que também deve ser esperto, porque senão, nem milhares de milhares de anos de experiência o safavam nos negócios...

Não sei de que filme falam, mas a mim só me lembra o "Motoqueiro Fantasma" com o Nicholas Cage ("Ele" enganou o Diabo... :p)

Adorei o tom "noir" do texto. Lembra-me logo uma série de filmes crus, como o que disse acima, e Sin City, por exemplo.

Cores escuras, com laivos de vermelho-sangue...

Leitura não recomendada a pessoas sensíveis em noites de trovoada... ;)

Beijitos, carinho, tenho de ir ao teu estaminé em breve, que estou em falta... :)

3 de março de 2010 às 16:21

Story:

Pois errei.

Hmpff.

4 de março de 2010 às 13:13

Para todas,

«May you be in heaven a full half hour before the devil knows you're dead» a Story desta vez tem razão.

Beijos

7 de março de 2010 às 15:55

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