O meu nome é Santiago. A minha vida corria bem. até "ela" ter aparecido. Corria tudo tão bem, que me dei ao luxo de largar o meu bem remunerado emprego e iniciar um trabalho por conta própria. A minha primeira empresa cresceu e vendi-a antes do mercado ficar saturado de concorrência. Abri a segunda e fiz o mesmo, esta segunda faliu 4 meses após a ter vendido. Fazia investimentos seguros e lucrativos, até ao dia em que apostei tudo no cavalo errado, inexplicavelmente perdi. Investi tudo o que tinha num novo projecto que faliu. Na mesma altura estive envolvido em 4 acidentes de automóvel, com a destruição total de dois carros e mais 2 acidentes menores. Fiquei na estaca zero, só com o meu carro acabado de comprar e ainda não pago e a minha casa, mas sem fontes de rendimento. Tudo passou a correr mal, a cada passo cometia um erro.
Foi nesta fase que tudo acabou com a minha namorada. Por mais que tentasse tudo falhava. Recebia mensagens de alguém que parecia saber da minha vida mais do que eu. Parecia que todas as portas se estavam a fechar e o mundo a desabar.
Dias antes desta minha fase ter começado, tive um sonho, com "ela":
Acordo em sobressalto, levanto-me e vou à casa de banho urinar. Enquanto urino, olho para trás e vejo um vulto azul com formas femininas, que flutua rapidamente na minha direcção. Antes de ela chegar a mim, acordo novamente e após acordar, acordo realmente. Ou seja eu acordei num sonho continuando a sonhar, tendo acordado ainda sonhando, até que acordei. Este sonho perturbou-me.
Após ter reconhecido a minha derrota financeira e sentimental, os sonhos pioraram.
Ao adormecer, acordava dentro dos meus sonhos e não me conseguia mexer, estava gelado, não mexia mãos, pés, nem conseguia falar. Nada. Lutava para recuperar controlo do meu corpo. Estes sonhos repetiram-se até eu aprender a forçar o meu acordar. Lembro-me de quando sonhava isto, pensar "acorda, acorda, acorda", enquanto forçava os movimentos. Assim que algo no meu corpo se mexe, acordo. Aprendi assim a sair dos sonhos, a fugir deles. Ainda hoje consigo forçar o meu acordar, consigo interromper os sonhos que não me agradam, acordando consciente de que fui eu que decidi acordar.
Certo dia, algo mudou. Acordei dentro do meu sonho, deitado onde adormeci, com o mesmo vulto azul em cima de mim a estrangular-me. Era a mesma forma feminina, com longos cabelos ondulados que ria histericamente. Não lhe via a cara era um fosso negro, nem conheço ninguém com um cabelo assim. Parecia ser uma mulher na casa dos 40.
Lutava por me mexer, enquanto me sentia sufocado, não conseguia falar, com esforço pronunciei uma palavra, "não", ela largou-me e eu acordei.
Perturbado, contei ao meu pai, que é uma pessoa que diz, "eu não acredito em bruxas mas que as há, há". A minha avó soube através do meu pai, ela é ainda daquelas que acredita em maus-olhados e bruxedos. Fez-me um teste antigo, de identificação de mau-olhado. O teste consistia no seguinte; encher uma malga se sopa com água e deitar-se um pouco de azeite. O Azeite, não se dissolve em água e tem tendência a juntar-se num só ponto e isso segundo ela, significa que está tudo bem. Quando o azeite se junta em vários pontos (inúmeras bolinhas), isto significa que há mau-olhado e resolver-se-ia com umas rezas antigas que ela conhece.
Eu não acreditava em nada disso, mas já que a fazia sentir-se melhor, deixei-a fazer o teste na minha presença. Os resultados foram fascinantes, o azeite em contacto com a água não se juntou, nem se separou, simplesmente desapareceu. A minha avó entrou em pânico, com o nível de mau olhado que aquilo significava. Eu fiquei incrédulo, pois o azeite não se dissolve em água.
Durante uma semana mal dormi, não queria adormecer tal como a actriz no filme "Pesadelo em Helm Street", durante essa semana a minha avó fez o mesmo teste acompanhado de rezas religiosas, até que um dia, o azeite se juntou e deu normal.
O meu pai perguntou-me se tinha voltado a ter esses episódios e eu respondi a verdade, que não. Ele disse-me, tudo isso foi resolvido. Achei melhor não perguntar como, pois sei que não iria gostar da resposta.
Na noite anterior à minha partida e quase um mês sem esses episódios, esse vulto negro e o meu congelamento do corpo voltou. Desta vez senti dor, como se o meu coração estivesse a ser arrancado do meu corpo, uma dor indescritível. Aí fiquei com a certeza que não era um sonho, acredito ainda hoje que não estava a dormir, estava sim naquela fronteira entre o consciente e o sono.
Tentei racionalizar, que os episódios paranormais são truques da mente. Eu andava, preocupado, nervoso, stressado e cansado, pois dormia pouco. Para mim essa era a explicação.
O que é certo é que passados 4 anos do meu afastamento daquela cidade e apesar de ter fazes mais stressantes e com menos descanso, isso nunca mais aconteceu, o meu azar passou e tenho uma vida normal com resultados positivos a nível profissional, pessoal e sentimental.
Sei que o meu trabalho, o meu sucesso, as minhas namoradas e o meu estilo de vida eram motivo de invejas, intrigas. De volta e meia tinha alguém a falar negativamente de mim nas minhas costas. Na minha vida sempre ouve lendas sobre mim, que pairavam como dúvidas, coisas que nunca me preocupei em confirmar ou negar, pois sempre me senti superior a intrigas. Combatia tudo isso vencendo as minhas batalhas diárias.
Tudo poderá ter uma explicação lógica.
Tudo poderá ter sido a minha mente a pregar-me partidas.
Tudo poderá ter sido uma acumulação de tanto mau karma, transpirado por certas pessoas.
Tudo poderá não ter qualquer tipo de explicação lógica.
Percebi a Lei de Murphy que diz que "quando alguma coisa pode correr mal, vai correr mal", quando pensamos que tudo corre mal, pode ainda correr pior.
Temos é de compreender, quando devemos de usar a nossa pouca força que resta, para lutar ou fugir.
Já que estamos a cair, não vale a pena lutar contra a queda, pois ela é inevitável. Devemos deixar-nos ir, guardando as forças que ainda temos, pois ao chegar ao fim do poço, só existe um caminho e esse caminho, é para cima. Lutar para voltar à superfície e não parar aí. Para um dia podermos olhar de cima para baixo, sobre todos esses sentimentos de inveja insignificantes, que depois já não nos atingem.
Sei que nada disso me voltará a atingir, pois essas pessoas são como moscas.
Esta noite acordei a meio do meu sono. Abri a janela e estava um frio horrível com um leve manto de neve que cobria tudo. Fico a observar o rio, coberto por um manto de nevoeiro. A certa altura algo despertou a minha atenção, do meio do nevoeiro observo algo que me é familiar.
Um vulto de mulher, vestida de azul, que lentamente saía do nevoeiro, aproximando-se de terra.
Não estava a dormir, nem dormi mais. Ela encontrou-me...