“Meu amor:
Acho que o meu coração perdeu o direito de te chamar assim. Meu nunca foste (ninguém é de ninguém), e amor não posso mais albergar neste meu peito, porque não se pode amar eternamente quem não nos ama.
Sei que vais gritar aos quatro ventos o tanto que me amavas, proclamar a tua inocência, a tua virtude para quem te quiser ouvir… e não tenho dúvidas de que terás uma audiência plena, cheia daquela gente que te adula os sentidos, de quem tanto precisas e que tanto desprezei. Serão os chacais que te ajudarão a despedaçar os pedaços da minha memória… por isso desejo que se deleitem, muito. Que a minha alma, essa, está a salvo dos ataques dos seus dentes famintos, e das tuas palavras acres.
Não consigo, não consigo caminhar mais a teu lado. Porque não caminho direita, e sim encurvada com o peso daquilo que querias, e que não sou. Não concebo como amor o que me devotas (ou devotavas, já nem sei), quando não me faz brilhar o olhar sentindo-me especial, quando não me faz aquecer o peito sabendo-me única.
As tuas críticas constantes, incompreensões repetidas e esse teu jeito de viver no pódio são simplesmente demais para alguém que só pretende o seu canto para descansar e se sentir em casa. E não, bolas, não basta dizer-se que se ama que o Mundo avança, não, porque o Amor é muito mais do que aquilo que vale para ti, o Amor é ter a capacidade de mostrar ao Outro o quão especial é. E, para ti, sempre fui alguém que muito tem a provar e muito tem a mudar. Se existisse uma lei que, para além dos maus tratos físicos e verbais, proibisse os maus tratos à alma eu estaria a aplicá-la na sua mais perfeita essência... porque até agora o meu ego apenas se alimentou à custa do tão pequena que fui, a teus olhos. E basta!
Vou-te deixar. E vou ao mesmo tempo deixar aquilo em que, durante algum tempo, acreditei.
Peço-te que me deixes ir. Apenas isso."